Estudante de Campo Grande, Pollyana Garcia tem 20 anos e o sonho de ser médica. Há três deles, vive uma rotina intensa de estudos para chegar lá.
Até terminar de conferir o desempenho nas 60 questões da prova do vestibular 2024 da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul), a instituição onde mais quer cursar Medicina, o coração batia forte pela boa quantidade de acertos. Mas a decepção foi grande ao olhar a nota na redação.
Ela tirou nota mínima, equivalente a zero, pelo texto não ter correspondido ao tema: "O direito às artes como direito à condição humana". A redação tem peso grande no resultado final alcançado por cada candidato, principalmente o daqueles que tentam cursos muito concorridos.
Foi mesmo decepcionante, só não surpreendente para a estudante. Ela afirma que já esperava isso da Fapec (Fundação de Apoio ao Ensino, Pesquisa e Cultura), banca avaliadora que elabora, aplica e corrige as provas do vestibular da UFMS, porque sabe de erros cometidos em provas anteriores e da fama de "não definir bem o que quer" na redação.
"Não somente eu, mas muitos colegas meus chegamos tensos no dia da prova, todos os anos. É principalmente por causa da redação. Parece que querem que a gente adivinhe o que precisa escrever", reclama Pollyana. "A gente já não coloca muita expectativa nesse vestibular", também lamenta.
Quase metade
Tiveram as redações zeradas 42% das pessoas que fizeram o vestibular da UFMS. São 6.203, num total de 14.701 candidatos.
Dos mais de 6 mil, 1.169 entraram com recurso pedindo a revisão da nota da redação. O resultado da reavaliação será publicado nesta sexta-feira (26).
Pollyana não conta com isso porque preferiu evitar mais uma frustração. No período de recurso referente ao vestibular 2023, ela se empenhou em comprovar que merecia uma nota melhor na redação, mas não foi o que aconteceu.
"Escrevi duas páginas inteiras de recurso com a ajuda de professores de redação, que avaliaram bem o meu texto. Só que a Fapec respondeu com uma justificativa de poucas linhas. Não foi um retorno satisfatório", diz a jovem.
Professores contestam
Sérgio Sampaio é um dos professores de Língua Portuguesa e Redação que participou de protesto contra a Fapec na Câmara Municipal de Campo Grande em 7 de dezembro do ano passado, questionando erros persistentes nas provas e correções feitas pela banca em cinco edições do vestibular da UFMS e também da UEMS (Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul).
Os erros prejudicaram muitos estudantes ao longo dos anos, ele afirma à reportagem. Sobre a redação de Pollyana, avalia que é um desses casos.
Professores e estudantes protestam na Câmara Municipal. Foto: arquivo/CG NewsNa opinião de Sérgio, o que mais atrapalha os vestibulandos nas redações pedidas pela Fapec, em geral, é a abrangência dos temas. "É uma amplitude temática muito grande, sendo que o habitual do vestibular é você entregar para o aluno uma autonomia dentro de um recorte temático", começa.
Há candidatos que se saem bem na redação do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) e de vestibulares de outros estados, realizados por outras bancas avaliadoras, mas que zeram a redação da Fapec. O professor acredita ser um indício da necessidade de mudanças, por mais que a fundação defenda se reservar a adotar critérios diferentes na avaliação em relação às demais bancas.
"A preparação para os vestibulares da UFMS e da UEMS a gente já tem que fazer diferente na sala de aula, por causa disso. Infelizmente, precisamos avisar nossos alunos que isso pode acontecer", diz ainda Sérgio. Ele cobra que a Fapec se comprometa com os ajustes necessários e receba professores em uma reunião para tratar disso.
A estudante de 20 anos confirma que alcançou notas muito próximas às máximas em outras quatro redações. "Aconteceu comigo e aconteceu com pessoas que eu conheço. O problema é que não tem como a gente adivinhar o que querem que a gente escreva", ela aponta.
Também professora de Língua Portuguesa e Redação da Capital, Milene Gasparini afirma que cobrar um tema muito amplo na redação acaba deixando os candidatos perdidos e gera um efeito cascata na avaliação.
"Se eles não atendem ao tópico 1, que é o entendimento do tema e adequação temática, ele acaba perdendo pontos também nos tópicos seguintes, onde não deveriam, como o de coesão e coerência. Um tema muito amplo permite diversas interpretações", explica.
Milene diz que também gostaria de ouvir a Fapec sobre o que tem acontecido nas edições dos vestibulares, diante de tantas reclamações. "Esse tem sido o nosso entendimento ao longo de todas as edições de vestibulares feitos por eles. Pode ser que estejamos errados, mas precisávamos saber, tendo uma conversa aberta e técnica com as pessoas que estão responsáveis pela banca. Nós não queremos ficar 'brigando', queremos resolver porque professores e alunos veem o problema se repetir", finaliza.
Fapec e universidades
O Campo Grande News perguntou à assessoria de imprensa da Fapec se a entidade pretende rever critérios e temas exigidos nas redações. Além disso, quis saber se já organizou ou pretende organizar alguma reunião com professores para tratar das críticas e prestar os esclarecimentos. Não houve resposta.
A reportagem também procurou a UFMS e a UEMS, instituições que contrataram a fundação para tomar conta de seus últimos vestibulares.
A UEMS afirmou em nota que "o contrato com a banca organizadora é firmado com prazo anual para execução de cada processo seletivo e avaliado pelas instâncias internas de controle ao final do prazo contratual" e que "eventuais ocorrências são analisadas e informadas para a banca contratada, nos termos das cláusulas contratuais". Finalizou garantindo que "processos referentes ao ingresso de estudantes são continuamente revisados e atualizados, sempre em busca de otimização e assertividade".
Já a UFMS não se manifestou até a publicação desta matéria.
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Pollyana relê a própria redação, avaliada por banca com nota mínima. ( Foto: arquivo pessoal)


