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Chuva estará mais ácida que o normal após queimadas, dizem especialistas

21 SET 2020 • POR Naiane Mesquita, Correio do Estado • 13h16

Por mais tentador que seja, a chuva que deve cair nos próximos dias em Mato Grosso do Sul (MS) não deve ser utilizada pela população para banhos ou mesmo consumo sem tratamento. Mais ácida do que o normal, ela carrega os diversos componentes químicos e poluentes resultantes das queimadas na região do Pantanal.  

“A água da chuva em geral já é um pouco mais ácida do que o normal. Enquanto a água tem um pH de 7, a água da chuva tem um pH de 5,6, justamente por causa da interação do dióxido de carbono, isso mesmo em condições limpas. Agora no período de queimadas, nós temos na atmosfera óxido de nitrogênio e óxido de enxofre. Esses óxidos reagem para formar uma precipitação ácida”, explica o professor Widinei Alves Fernandes, doutor em Geofísica Espacial pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).

Com as queimadas há semanas no Pantanal, a chuva deve ser mais ácida e poluída do que o normal. 

“Essa chuva aumenta a chance de corrosão em construções, tem danos à vegetação, tem impacto na floresta; até a acidez dos lagos vai mudar, porque você está injetando lá algo diferente”, indica.  Fernandes ressalta ainda que as fuligens decorrentes das queimadas também podem voltar à terra junto das primeiras chuvas. 

“Se houver na atmosfera fuligem, também a atmosfera vai lavar essas partículas. Eu acredito que o nível mais perigoso já passou e vai melhorar nos próximos dias, porque os ventos vão deslocando essa poluição. Se a chuva ocorrer na região onde tem essa fuligem, essas partículas vão descer, que é o que hoje as pessoas chamam de chuva negra – que a origem da palavra se dá a chuva radioativa do passado, mas que hoje se usa esse termo para falar dessas condições”, indica.

Segundo o especialista, em 2019 ocorreu a chuva negra em São Paulo.  

Atraso nas chuvas

As queimadas também podem ter influenciado no regime de chuvas, inclusive no atraso das precipitações, previstas para a semana passada. Segundo o professor, para a chuva ocorrer é necessário o vapor de água, calor e partículas sólidas, como poeira ou até mesmo as queimadas.  Porém, com o número excessivo de queimadas e, consequentemente, partículas, o processo acaba sofrendo um desiquilíbrio. 

“Com as queimadas, a quantidade de partículas aumenta muito. Isso faz com que a gota da nuvem se inicie com um tamanho muito pequeno, ou seja, essa gota vai ter um tempo de vida maior até ela crescer a ponto de formar uma gota, se precipitar e cair no solo. Quando ela inicia pequena, a tendência é que às vezes ela não consiga crescer o suficiente e que toda aquela umidade se evapore antes de se tornar chuva”, indica.  

Segundo Fernandes, é necessário analisar outros pontos para definir o porquê da demora na ocorrência das precipitações, mas esse pode ser um dos motivos. “Essas queimadas impactam no regime de chuva. É um evento que a gente sabe que ocorre, sim”, frisa. 

Restrição

A concentração de poluentes no ar de Mato Grosso do Sul cresceu em setembro, em razão das queimada no Pantanal. Dados de satélite indicam que só de dióxido de nitrogênio houve uma concentração quatro vezes maior este mês no Estado.