Em evento realizado no Congresso Nacional, em Brasília, na terça-feira, 24 de junho, representantes do MapBiomas apresentaram a primeira edição do Relatório Anual do Fogo (RAF), elaborado a partir de dados abertos, análises robustas e mapas de alta resolução que compilam informações precisas sobre as queimadas e incêndios florestais registrados no Brasil ao longo de 2024 e nas últimas quatro décadas.
Intitulado 40 Anos de Fogo nos Biomas Brasileiros: Coleção 4 do MapBiomas Fogo (1985 a 2024), o documento lança um alerta contundente: o fogo no Brasil tem atingido níveis inéditos em extensão e severidade, com um avanço sem precedentes sobre vegetações nativas de biomas não adaptados ao fogo, como a Amazônia e a Mata Atlântica, realidade que exige respostas urgentes das autoridades públicas e da sociedade civil. Nesse sentido, o relatório fornece subsídios científicos que contribuem para a atuação coordenada entre municípios, estados e órgãos federais.
Entre outros números superlativos que dimensionam a gravidade do atual cenário, o RAF revela que, em 2024, o Brasil teve 30 milhões de hectares queimados, um volume 62% acima da média histórica anual, consolidando o ano como um dos mais críticos em termos de incêndios florestais desde o início da série histórica.
Os dados relativos ao bioma Pantanal consolidam estudos locais já referenciados por instituições como o SOS Pantanal, organização de conservação ambiental com atuação desde 2009. Proporcionalmente, o Pantanal foi o mais afetado pelo fogo nos últimos 40 anos. Nesse período, a quase totalidade (93%) dos incêndios registrados no bioma ocorreu em vegetações nativas, especialmente em formações campestres e campos alagados (71%). As pastagens representaram 4% das áreas atingidas por fogo.
O Pantanal mostra também uma grande recorrência do fogo: três em cada quatro hectares (72%) queimaram duas vezes ou mais nas últimas quatro décadas. As cicatrizes deixadas costumam ser mais extensas do que em outros biomas: é no Pantanal que se encontra a maior incidência de extensões queimadas superiores a 100 mil hectares (19,6%). Distribuídas por diferentes regiões, áreas com cicatrizes de queimada entre 500 e 10 mil hectares também se destacam (29,5%).
Em 2024, houve, também, um aumento de 157% da área queimada no Pantanal, na comparação com a média histórica de 40 anos avaliada pelo MapBiomas Fogo.
“Os dados históricos mostram a dinâmica do fogo no Pantanal, que se relaciona com a presença da vegetação natural e com os períodos de seca. Em 2024, o bioma queimou no entorno do Rio Paraguai, região que passa por maiores períodos de seca desde a última grande cheia em 2018”, explica Eduardo Rosa, coordenador de mapeamento do Pantanal no MapBiomas.
Corumbá, Município de maior extensão do bioma, detém outro triste recorde: de acordo com os dados do RAF, é a cidade brasileira com maior área queimada acumulada entre 1985 e 2024, com mais de 3,8 milhões de hectares.
“A coleção 4 do Map Biomas Fogo nos mostra a intensificação dos incêndios florestais e sua elevada recorrência, especialmente nos últimos 10 anos. Entender a dinâmica do fogo no cenário de mudanças climáticas é fundamental para desenvolvermos estratégias cada vez mais robustas para que tenhamos territórios e comunidades adaptadas e resilientes ao fogo. Quanto mais preparados as organizações, governos e, principalmente, os pantaneiros estiverem, menor será a severidade desses incêndios e seus impactos no modo de vida local e na conservação do bioma”, defende Leonardo Gomes, Diretor Executivo do SOS Pantanal.
Expansão das Brigadas Pantaneiras
O Instituto segue trabalhando na implementação de planos operativos nas regiões mais vulneráveis e se prepara para a temporada crítica de incêndios em agosto e setembro. Uma das frentes de atuação mais relevantes do SOS Pantanal, O Projeto Brigadas Pantaneiras, parte do Programa de Prevenção e Combate a Incêndios Florestais da instituição, segue avançando em 2025 com foco na valorização das comunidades locais, proteção da biodiversidade e manejo integrado do fogo.
Neste ano, uma nova brigada foi formada no Pantanal Sul e 88 brigadistas de 13 brigadas passaram pela capacitação anual promovida pelo SOS Pantanal em parceria com o Corpo de Bombeiros de Mato Grosso do Sul.
Entre os dias 2 e 3 de abril, o instituto também realizou o I Seminário Internacional de Manejo Integrado do Fogo no estado, reunindo 20 palestrantes, 75 participantes presenciais e mais de 1.100 online, alcançando mais de 26 mil interações.
Como parte do fortalecimento regional, o SOS Pantanal submeteu três propostas ao edital “PSA Brigadas”, do Fundo Pantanal – Governo do Mato Grosso do Sul, e apoiou outros três projetos de instituições parceiras. Outra frente importante em andamento é o desenvolvimento do Plano Operativo de Prevenção e Combate a Incêndios nas fazendas da Aliança 5P, que visa a atuação nos Pantanais de Miranda, Aquidauana e Nhecolândia, com estratégias práticas para gestão do fogo.
Concentração temporal e sazonal no RAF do MapBiomas
Contribuindo para uma compreensão do avanço temporal das queimadas, o RAF destaca que, desde 1985, 206 milhões de hectares foram afetados pelo fogo ao menos uma vez, o que equivale a 24% do território nacional ou a soma territorial dos estados do Pará e Mato Grosso, sendo que quase metade de toda essa área queimada, mais precisamente 43%, se concentrou no intervalo dos últimos dez anos, dado que evidencia uma escalada recente na ocorrência de queimadas no país.
A forte concentração sazonal desses eventos também chama atenção: o estudo esclarece que 72% da área queimada anualmente se dá no período entre agosto e outubro, com destaque para o mês de setembro, responsável por 33% deste total. A compreensão desses recortes reforça a urgência de políticas públicas coordenadas voltadas à prevenção e ao controle de incêndios nos meses mais críticos.
Escalada do fogo em outros biomas
O RAF aponta, ainda, a Amazônia como o epicentro das queimadas em 2024, com 15,6 milhões de hectares consumidos – mais da metade da área total queimada no Brasil e o maior valor da série histórica, 117% acima da média. Pela primeira vez, a vegetação florestal superou as pastagens como uso da terra mais afetado, somando 6,7 milhões de hectares queimados.
A Mata Atlântica também registrou um recorde negativo, com 1,2 milhão de hectares queimados, um aumento de 261% sobre a média histórica, principalmente em áreas já alteradas pela ação humana. O Cerrado apresentou os dados mais preocupantes: 3,7 milhões de hectares queimaram mais de 16 vezes em 2024, e a formação florestal perdeu 7,7 milhões de hectares, 287% acima da média.
Balanço positivo
Por outro lado, nem todas os dados apresentados no RAF são negativos. Totalizando 404 mil hectares, abaixo da média histórica, a Caatinga teve uma redução de 16% de área queimada. No Pampa, a incidência de chuvas intensas causadas pelo El Niño também contribuiu para a redução das queimadas, que atingiram 15,3 mil hectares.
Outro aspecto positivo do RAF é o avanço nos recursos de monitoramento e na acessibilidade às informações a partir da plataforma do MapBiomas Fogo, que disponibiliza dados detalhados e gratuitos sobre queimadas em todo o país. Com a evolução de recursos como os algoritmos de inteligência artificial da Deep Neural Network (DNN), processamento em nuvens e imagens geradas a partir do Landsat, programa de satélites da NASA e do Serviço Geológico dos Estados Unidos que coleta imagens da superfície da Terra para monitoramento ambiental, o MapBiomas Fogo oferece, cada vez mais, ferramentas eficazes para subsidiar elementos científicos que possam orientar políticas públicas e prevenir desastres.
Sobre o MapBiomas
Iniciativa multi-institucional que envolve universidades, ONGs e empresas de tecnologia focada em monitorar as transformações na cobertura e no uso da terra no Brasil, para buscar a conservação e o manejo sustentável dos recursos naturais como forma de combate às mudanças climáticas. Esta plataforma é hoje a mais completa, atualizada e detalhada base de dados espaciais de uso da terra em um país disponível no mundo. Todos os dados, mapas, métodos e códigos do MapBiomas são disponibilizados de forma pública e gratuita no site brasil.mapbiomas.org
Sobre o SOS Pantanal
O Instituto Socioambiental da Bacia do Alto Paraguai SOS Pantanal é uma organização ambiental criada em 2009 que atua na conservação do Pantanal, promovendo o aprimoramento de políticas públicas, a divulgação de conhecimento e o desenvolvimento de projetos para o uso sustentável do bioma. Por meio da ciência e do diálogo, o SOS Pantanal fomenta as transformações necessárias com o apoio de diversos setores da sociedade civil e do poder público. Saiba mais em: sosopantanal.org.br.
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