O Ministério Público Federal no Mato Grosso do Sul (MPF/MS) pediu, por meio de habeas corpus (HC), a liberdade de um boliviano sustentando que ele foi alvo de um ato de entrega ilegal ao Estado brasileiro. Preso em flagrante por tráfico de cocaína na região de Corumbá, o acusado tentou fugir para o outro lado da fronteira, mas foi entregue pela polícia boliviana à Polícia Federal brasileira em seguida. Para o MPF, a Bolívia somente poderia ter entregue o cidadão estrangeiro ao Brasil por meio de um ato formal de extradição.
Em uma fiscalização de rotina realizada no Posto Fiscal da Inspetoria da Receita Federal em Corumbá, localizado na fronteira entre Brasil e Bolívia, o boliviano foi abordado, em tese, portando 3.155 gramas de cocaína. Ele tentou fugir, correndo a pé até a linha de fronteira para entrar na Bolívia. Ao perceber a fuga, a polícia boliviana o deteve e ele foi entregue à Polícia Federal brasileira, que o prendeu em flagrante e o levou à Delegacia de Corumbá para interrogá-lo. E algumas horas depois, a Justiça Federal em Corumbá determinou a prisão preventiva.
O MPF, analisando o caso, de início requereu o relaxamento da prisão preventiva, sustentando que o ato de entrega violou frontalmente as normas de cooperação internacional vigentes entre Brasil e Bolívia, e que, em razão desta ilegalidade, a prisão em flagrante e a preventiva foram invariavelmente contaminadas, tornando impositiva sua soltura, para não mais prolongar o constrangimento ilegal imposto ao cidadão estrangeiro.
Como este pedido inicial foi negado pelo juízo federal da 4ª Subseção Judiciária do Mato Grosso do Sul, contra essa decisão, o MPF, então, impetrou habeas corpus para cessar a restrição ilegal ao direito de liberdade, efetivada em contradição com as normas constitucionais e legais em vigor.
O HC impetrado sustenta que a entrega em análise constituiu a chamada “extradição por empurrão” ou “extradição de fato”, uma forma ilegal de transposição de um sujeito, de um Estado a outro, sem a observância dos regramentos procedimentais e materiais pertinentes ao processo extradicional. E para o procurador da República Yuri Corrêa da Luz, essa prática não pode ser admitida pelo Estado brasileiro, “seja porque violadora da soberania do Estado boliviano, que o Brasil se comprometeu a respeitar, seja porque violadora de diversos direitos fundamentais previstos na ordem interna brasileira e na ordem jurídica internacional”.
No pedido de HC, Yuri Corrêa da Luz cita análise do secretário de cooperação internacional, Vladimir Aras, sobre atos ilegais como a “extradição por empurrão”, em que chama a atenção para a “principiologia que o país abraçou no artigo 4º da Constituição Federal, que consagra o respeito à soberania estrangeira (não-intervenção) e a prevalência dos direitos humanos, inclusive o direito de qualquer pessoa não ser presa sem o devido processo legal (art. 5º, LIV, Constituição Federal)”.
Segundo o procurador da República, a violação destes direitos torna urgente a restituição da liberdade de Jorge Romero, até mesmo pelas potenciais repercussões diplomáticas que esta prisão pode vir a ter, caso o Estado boliviano vislumbre que o Estado brasileiro estaria mantendo um cidadão seu segregado em violação às regras de cooperação internacional que vigoram entre estes dois países.
Para o secretário de cooperação internacional, Vladimir Aras, "a iniciativa do colega Yuri Luz é louvável e põe na berlinda um tema que precisa ser urgentemente resolvido pelos órgãos de soberania dos países da região, para que a cooperação fronteiriça possa ocorrer de acordo com as constituições, as leis e os tratados, num ambiente de proteção da segurança pública e dos direitos fundamentais de todos". As informações são da Secretaria de Comunicação Social MPF/MS.
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