Não é de agora que a Comissão dos Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil em Campo Grande e Corumbá vem recebendo denúncias de familiares de internos, que sofrem humilhações durante a revista para entrada nos presídios a fim de visita durante os finais de semana. A punição para os infratores é a perda da liberdade, mas todos os outros direitos são assegurados por lei e devem ser respeitados. O mesmo ocorre com as normas estabelecidas na resolução de 5 de agosto de 2014 que dispõe sobre o modo como deve ser feita a revista pessoal. O documento, que foi publicado em Diário Oficial no mesmo ano, garante a inviolabilidade da intimidade da pessoa humana e deixa claro que é proibido exigir que as visitas fiquem nuas, que façam ‘agachadinha’ ou usem cães farejadores. A resolução foi assinada pelo então Presidente do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária Luiz Antônio Silva Bressane que assegurou o direito da privacidade a fim de coibir qualquer forma de tratamento desumano ou degradante, expressamente vedado no art. 5º, inciso III, da Constituição Federal; A resolução cita ainda o art. 5º, inciso X, ab initio, da Constituição Federal, que estabelece a inviolabilidade da intimidade e da honra das pessoas.
Baseados nessa premissa o Presidente da Comissão dos Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil de Campo Grande, Christopher Pinho Ferro Spinelli conseguiu através da Agepen (Agencia Penitenciaria) que gerencia os estabelecimentos penais de Mato Grosso do Sul melhorar as condições de tratamento para visitantes de internos no presidio de Dois Irmãos do Buriti.
No local , as visitas, além de passar pelo detector de metais era obrigada a se despir na frente de outras mulheres e ainda abrir as pernas sobre um espelho, onde as agentes exigiam que esfregasse um papel para ver o interior do órgão genital, sob a alegação de que poderiam esconder objetos , chips e até aparelhos celulares. “ Obviamente que todos sabemos das manobras de algumas pessoas para entrar com esses equipamentos, mas não são todas. E não devemos ser punidas pelos crimes cometidos por outros” , disse H. V, estudante de 27 anos, que tinha um irmão preso em Dois Irmãos, “ além disso , exigiam as ‘agachadinhas’ de frente e costas. No meu caso nunca me importei porque sou jovem, mas, via senhoras idosas que visitavam os filhos e saiam dali chorando, envergonhadas” , disse a estudante explicando que evitava as visitas por causa dessa revista, “ humilhante. É dessa forma que descrevo. Somos seres humanos, mas, muitas vezes, fomos tratadas pior que gado em estrebaria”
Diante dessa situação, e com a resolução publicada para seu cumprimento , o advogado imediatamente entrou em contato com a Agepen e em 45 dias retiraram o espelho, entretanto, as pessoas continuam se despindo, pulando e se humilhando para visitar familiar interno, e em Corumbá , fora o espelho, as ‘revistas’ ocorrem da mesma forma, e o Conselho da Ordem em Campo Grande e Corumbá já foram notificados sobre a situação, entretanto, a comissão da sub seccional de Corumbá não quis falar sobre o assunto.
Desta forma o Capital do Pantanal conversou com Christopher Spinelli, durante sua vinda a Corumbá nesta manhã de quinta-feira,07 de Julho e ele disse que assim que recebeu as denúncias se lembrou do caso de Dois Irmãos do Buriti .que conseguiu solucionar e prometeu cobrar do sistema o cumprimento desta resolução, ou exigir que o Estado se aparelhe de forma a cumprir a lei.
Spinelli explicou que que esta resolução traz expressamente uma situação preconizada em vários tratados internacionais de Direitos Humanos, “ existe uma hierarquia entre as normas e a resolução está na base de complementação legislativa, então tem que atender o arcabouço jurídico. E o teor dessa resolução só transcreve o princípio do caráter concreto o que já havia sido assinado pelo Brasil nas convenções Internacionais dos Direitos Humanos. Enfim, as normas, apesar de sua hierarquia, existem para serem cumpridas devido ao princípio da legalidade previsto no artigo 5º caput da Constituição Federal, então os órgãos públicos tem o dever de cumprir essa legislação, caso ela não cumpra compete aos órgãos fiscalizadores adotarem procedimentos para que sejam cumpridas” , disse o Conselheiro dos Direitos Humanos da OAB Estadual em entrevista exclusiva com o Capital do Pantanal.
Quanto a fiscalização, Spinelli deixou claro que em Mato Grosso do Sul, os presídios são gerenciados pela Agepen, “ é uma autarquia estadual que tem essa especificidade de cuidar de todo sistema penitenciário, ligada indiretamente a Sejusp que compete a fiscalização e ao Ministério Público que também possui poder fiscalizatório. Temos também a figura do Conselho Penitenciário Estadual ao qual sou conselheiro, e que tem também tem função de fiscalizar e a OAB que apesar de não poder aplicar nenhum tipo de sansão, temos meios de solucionar os conflitos e resolver esses problemas” , disse enfatizando que após o princípio de rebelião no presidio de segurança máxima na Capital a Ordem conseguiu abrir um canal de comunicação eficiente com a Agepen, justamente para esmiuçar esses problemas e adequar a realidade a lei .
Quanto as denúncias de revista em desacordo com a resolução no presídio de Corumbá, ele disse que vai tomar todas as providencias necessárias para que o Estado cumpra a lei, “ mediante essa denúncia, a qual não tínhamos conhecimento, vamos entrar em acordo com a Agepen para que possamos fazer as adequações e a legislação seja cumprida, vamos lutar para que isso seja respeitado. Apesar de termos um papel democrático, e institucional de, diante de violação da lei ou normas jurídicas fundamentais no nosso estado temos a obrigação de instruir para que essa situação seja resolvida” .
O advogado não falou em prazos mas, disse que é importante as pessoas denunciarem através do site da OAB. Ele enfatizou que não defende bandido, mas a dignidade humana, “ a minha especialidade é criminal e já fiz parte dos Diretos Humanos, e defendemos os direitos e obrigações da pessoa humana. Não é porque foi presa que sua dignidade, saúde e educação seja cerceada. Todos os demais direitos continuam plenos e precisam ser respeitados. Se para os presos a constituição garante esses direitos imagine para as outras pessoas que não devem a justiça” .
Resolução
MINISTÉRIO DA JUSTIÇA
CONSELHO NACIONAL DE POLÍTICA CRIMINAL E PENITENCIÁRIA
DOU de 02/09/2014 (nº 168, Seção 1, pág. 26)
O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE POLÍTICA CRIMINAL E PENITENCIÁRIA (CNPCP), no uso de suas atribuições legais e regimentais,
considerando que a dignidade da pessoa humana é princípio fundamental do Estado Democrático de Direito, instituído pelo art. 1º, inciso III, da Constituição Federal;
considerando o disposto no art. 5º, inciso X, ab initio, da Constituição Federal, que estabelece a inviolabilidade da intimidade e da honra das pessoas;
considerando a necessidade de coibir qualquer forma de tratamento desumano ou degradante, expressamente vedado no art. 5º, inciso III, da Constituição Federal;
considerando a necessidade de manter a integridade física e moral dos internos, visitantes, servidores e autoridades que visitem ou exerçam suas funções no sistema penitenciário brasileiro;
considerando o disposto no art. 3º da Lei nº 10.792/2003, que determina que todos que queiram ter acesso aos estabelecimentos penais devem se submeter aos aparelhos detectores de metais, independentemente de cargo ou função pública;
considerando que o art. 74 da Lei de Execução Penal determina que o departamento penitenciário local deve supervisionar e coordenar o funcionamento dos estabelecimentos penais que possuir;
considerando que a necessidade de prevenir crimes no sistema penitenciário não pode afastar o respeito ao Estado Democrático de Direito, resolve: recomendar que a revista de pessoas por ocasião do ingresso nos estabelecimentos penais seja efetuada com observância do seguinte:
Art. 1º - A revista pessoal é a inspeção que se efetua, com fins de segurança, em todas as pessoas que pretendem ingressar em locais de privação de liberdade e que venham a ter contato direto ou indireto com pessoas privadas de liberdade ou com o interior do estabelecimento, devendo preservar a integridade física, psicológica e moral da pessoa revistada.
Parágrafo único - A revista pessoal deverá ocorrer mediante uso de equipamentos eletrônicos detectores de metais, aparelhos de raio-x, scanner corporal, dentre outras tecnologias e equipamentos de segurança capazes de identificar armas, explosivos, drogas ou outros objetos ilícitos, ou, excepcionalmente, de forma manual.
Art. 2º - São vedadas quaisquer formas de revista vexatória, desumana ou degradante.
Parágrafo único - Consideram-se, dentre outras, formas de revista vexatória, desumana ou degradante:
I - desnudamento parcial ou total;
II - qualquer conduta que implique a introdução de objetos nas cavidades corporais da pessoa revistada;
III - uso de cães ou animais farejadores, ainda que treinados para esse fim;
IV - agachamento ou saltos.
Art. 3º - O acesso de gestantes ou pessoas com qualquer limitação física impeditiva da utilização de recursos tecnológicos aos estabelecimentos prisionais será assegurado pelas autoridades administrativas, observado o disposto nesta Resolução.
Art. 4º - A revista pessoal em crianças e adolescentes deve ser precedida de autorização expressa de seu representante legal e somente será realizada na presença deste.
Art. 5º - Cabe à administração penitenciária estabelecer medidas de segurança e de controle de acesso às unidades prisionais, observado o disposto nesta Resolução.
Art. 6º - Revogam-se as Resoluções nºs 1/2000 e 9/2006 do CNPCP.
Art. 7º - Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.
LUIZ ANTÔNIO SILVA BRESSANE