Na teoria, a segurança pública é uma engrenagem.
Na prática, cada peça gira por conta própria.
Em Corumbá, cidade de fronteira, o contraste entre estruturas federais e estaduais mostra que o problema não é a falta de polícia, mas a falta de integração.
A Polícia Federal obteve recursos para uma nova sede avaliada em cerca de R$ 30 milhões. Enquanto isso, a Polícia Civil continua em prédios antigos, com viaturas no limite e recursos que dependem de emendas parlamentares. Esse é o retrato de um país onde o investimento chega, mas a integração entre as forças não.
O crime, ao contrário, opera como sistema: ágil, conectado e sem fronteiras. Essa talvez seja a constatação mais incômoda. O crime entendeu o que o poder público ainda não conseguiu praticar: a lógica da cooperação.
Em Corumbá, o reflexo dessa desigualdade é evidente. A maior delegacia do interior do Estado funciona com apenas um delegado, poucos escrivães e um número reduzido de investigadores para atender uma das maiores demandas do Mato Grosso do Sul. A sobrecarga é constante e a complexidade da fronteira multiplica as ocorrências. Enquanto cidades sem os desafios da criminalidade transnacional contam com mais delegacias e efetivo ampliado, Corumbá segue como um ponto estratégico vulnerável.
Esse cenário não se resume à estrutura física. Ele começa na forma como o país trata seus profissionais de segurança. Homens e mulheres que arriscam a própria vida convivem com salários defasados, planos de carreira engessados e um reconhecimento que raramente chega.
A Constituição Federal, no artigo 144, e a Lei 13.675/2018, que instituiu o Sistema Único de Segurança Pública (SUSP), preveem integração e valorização das forças. Mas, na prática, a cooperação ainda é fragmentada, e a valorização, uma promessa adiada.
Segurança pública não se faz apenas com prédios e viaturas. Exige respeito a quem veste a farda, investimento contínuo e planejamento conjunto. Porque nenhum sistema é mais forte do que o valor que dá às pessoas que o sustentam.
Enquanto as instituições se modernizam de forma isolada, o crime segue se aperfeiçoando em rede. E o preço desse desequilíbrio é pago todos os dias: em vulnerabilidade, medo e na perda de confiança em um Estado que cobra muito de quem dá tudo e recebe tão pouco em troca.
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